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Arnach Ronam Baromir .

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Por Renato Curty

Nascido no palácio de seu pai, o Conde Édipo de Baldor, no extremo sul de Plana, o gêmeo Arnach (em antigo Malês Setentrional, “morto-há-eras”) foi o escolhido por Édipo, um poderoso demonista, para ser sacrificado em nome do demônio MaldorFruz. Seu irmão, Philis (“Luz”, em élfico do oeste) foi entregue nos braços de sua mãe, Éalana, enquanto mentiam sobre a morte do outro gêmeo.

O ritual profano seria realizado por Édipo na floresta élfica Shagrat. Seria, se não fosse a intervenção dos elfos florestais daquele lugar. O conde foi banido e seus diáconos morreram perfurados por flechas élficas. Os elfos, então, acolheram a criança que seria sacrificada julgando ser este o destino escolhido por Palier.

(Arnach não conhece os fatos até aqui descritos, pois os elfos nunca lhe contaram).

***

Só soube que fui acolhido por elfos de Shagrat quando ainda sequer sabia falar. Na minha alma, eu sempre me perguntava o porquê disso. Essa palavra, “acolhido”, é um exagero, claro. Os elfos de Shagrat, extremamente xenófobos, nunca admitiram a permanência de outro “leigo” (era como eles chamam todos os não-elfos), além de mim, nas suas sagradas florestas. Nunca recebi o carinho de qualquer “mãe” e continuamente sofria perseguições das outras crianças élficas na minha infância. Sempre soube que era adotado; o velho Éolin, sacerdote do templo de Palier, fazia questão de me dizer isso a cada oportunidade. Entende meus questionamentos agora? Será que o morrer abandonado não teria sido menos sofrido?

Nessa época, realmente, não me importava em fazer o trabalho pesado, numa tentativa desesperada de uma criança em ser aceita. Todo meu trabalho era nada para eles... até os meus dez anos de idade, nunca haviam me ensinado o Élfico, nem letras nem palavras. Todos falavam comigo o Malês comum, usavam comigo a língua dos homens para que eu nunca me esquecesse de minha condição de ser um humano, e não um elfo. Claro como o Sol, não?

Como eu era mais forte que a média (aliás, tenho certeza, se não fosse a magia, os elfos já estariam mortos há eras – como o meu nome), fui designado para ser treinado como um guerreiro. Eles confiavam apenas no arco e alguns poucos usavam gládios. Queriam que me tornasse um arqueiro, porém a essa altura já estava revoltado com a maneira como todos me tratavam e rejeitei o treinamento militar élfico. Obviamente, fui punido.

Como punição, me colocaram na escória de toda a sua sociedade, a pior ocupação para um elfo: eu seria um lenhador. Era engraçado, cômico mesmo, já que no inverno todos precisavam de lenha, mas oravam antes, durante e após a queima, com medo de que Maira, sua deusa, os desgraçasse. Posso não ser sacerdote, mas se uma deusa precisa de orações tão falsas assim, palavras essas apenas para proteger seus interesses, que dirá do lugar que Maira tem preparado para eles assim que morrerem...

Como nas outras estações eu ficava mais livre e, embora os elfos mais jovens jamais admitissem, era muito inteligente, por isso fui recebido como pupilo por Eliad Wood, um mago elementalista de Shagrat. Pelo menos um terço dos elfos adultos (acima de cento e vinte e três anos) passavam pelo colégio da luz de Shagrat (Colégio Lítuen – luz eterna, em élfico). Poucos realmente ficavam. Passei então a acreditar nas palavras que o velho Éolin sempre dizia: “Palier só abençoa os escolhidos. Os outros são leigos, nada mais”.

Com doze anos, Eliad me ensinou a escrita élfica, história, geografia e princípios de teoria mágica. Aos treze já havia dominado a língua élfica, a lógica dos números e já sabia concentrar Energia Elétrica nas mãos, mesmo que ela não saísse de lá. Foi aí que recebi meu primeiro sobrenome — Ronam, que significa “meia-luz”.

Nunca mais parei de aprender. Conheci a manipulação de luz e escuridão e poderia até matar um desavisado com o Raio que eu liberava, apesar da dificuldade em me concentrar. Dentro de um ano iria começar a aprender manipulação de ilusões, o trunfo dos elfos. Sim, ainda que essa idéia desagradasse sobremaneira os outros magos, que eram realmente elfos. Isso deveras me aborrecia, mas sempre confiei em Eliad (afinal ele me ensinou muito e me apoiou como um pai faria a um filho). Nessa época, eu tinha pouco mais que quinze anos.

***

Mas o destino não estava em minhas mãos. Durante uma incursão de um grupo de oito anões, que estava bem próximo da floresta, um combate aconteceu. Como os elfos são covardes, atacaram à distância com seus arcos frágeis. Os anões, apanhados de surpresa, nem tiveram tempo de reagir. Pelo que sei, apenas 3 sobreviveram, mas pessoalmente só conheci um: Artinc Moa Baromir, filho de Torin, Senhor de Baromir, uma cidade dos Anões.

Como nenhum elfo queria se aproximar dos leigos mais odiados por eles, eu fui designado para levar seu prato de trigo com água todas as manhãs e todas as noites. Artinc tentou falar comigo na sua língua várias vezes, porém vãs eram suas tentativas, eu pouco as entendia, apenas olhava atentamente. Ele acreditava que eu só falasse élfico, até que um dia, sem querer, eu assoviei uma cantiga de ninar em Malês. Grande foi a minha surpresa ao vê-lo completar a música com um belo acorde!

Nossa amizade durou apenas 4 meses. Nesse tempo eu conheci toda a honra e lealdade que são inalienáveis aos anões, assim como um pouco de sua língua (que, aliás, recebia muito mais reverência que o próprio élfico, que dirá o malês com o qual eu era humilhado). Infelizmente, o príncipe morreu de desgosto, pelo que sei, mas os guardas élficos registraram por fome já que ele pouco se servia da ração pobre que recebia.

Para ser sincero, a meu ver, havia crueldade élfica na morte do prisioneiro. Apesar de não ter voltado a treinar como guerreiro, um manual escrito por uma ordem de cavalaria de Plana (que eu retive comigo) falava, em um capítulo, sobre prisioneiros. Eles teriam direito à alimentação justa, entre outros direitos, e eu comecei a questionar ainda mais os valores élficos. Pelo menos daqueles que viviam naquela floresta maldita.

***

Mas, agora sim eu entendo a quem pertence o destino. Pouco depois da morte de Artinc, os deuses permitiram que um grande grupo de anões viesse às florestas de Shagrat em busca do príncipe e sua comitiva. Sem dúvida, todos eles morreriam em combate, afinal eu conhecia a magia élfica e também seus arcos. Além disso, a floresta possuía diversas armadilhas.

Com o que aprendi sobre cartografia com Eliad, passei duas noites e um dia fazendo um mapa detalhado dos esconderijos, armadilhas e tesouros do povo florestal. Naquela noite, orei a Palier para que me dissesse o que fazer com o conhecimento que eu havia passado para o papel: queimar ou enviar ao comandante das tropas anãs.

Era uma noite de inverno, algumas famílias élficas reclamavam que eu não havia entregado a lenha, mas certamente, nas horas em que se seguiram, houve fogo suficiente para aquecer toda a floresta. Como os anões enxergavam no escuro e possuíam o meu mapa, seu ataque foi fatal. Não entraram no templo de Palier, como eu havia pedido. Porém, quando estava quase tudo terminado, eles foram até lá e me arrastaram para fora da floresta.

Nem sei por quanto tempo viajei. Acho que tinha uns dezessete anos quando me encontrei face a face com Torin Punho de Ferro, Anão-Chefe de Baromir. Diante daquele ser menor do que eu, porém com uma imponência digna de invejar o mais destemido gigante, fui interrogado acerca do seu filho, o príncipe Artinc. No início vi a expressão de alegria nos seus rostos barbados quando, pronunciando o pouco que havia aprendido na Voz da Pedra, contei sobre a nossa amizade. Mas logo o desapontamento ficou nítido quando souberam de sua trágica morte. Até hoje me lembro das palavras de Torin:

— “Arnach, não te preocupes, tu agora és amigo do povo anão das montanhas e minas de Baromir. E eu, como líder de todo este povo, sou o primeiro a te trazer para a minha casa e beberás e comerás o que eu beber e comer”.

Depois eu soube que nunca houvera na história desse povo (e eles viviam há mais tempo do que um humano e suas dez gerações seguintes possam contar) uma homenagem assim a um homem, na qual este recebesse o sobrenome de um soberano anão. Ao contrário dos elfos, durante todos os anos que vivi entre os anões (pelo menos seis anos), nenhum deles mostrou-se invejoso de tal honraria por mim recebida. Trazia no peito o símbolo de Baromir e ganhei um machado tão grande e tão belo que pensei em deixar de lado os caminhos da magia.

***

Em alguns momentos, nós controlamos o nosso destino. Foi assim que, deixando a casa de Baromir e todos os anões, depois de tantos anos de lutas e aventuras, busquei conhecer o mundo que me foi negado quando era criança. Nunca soube sobre o paradeiro de meus verdadeiros pais; nem verdades, nem boatos. Talvez os elfos soubessem, mas mesmo que eles desconhecessem quem causou a ruína das suas sagradas florestas, não pude reunir forças para voltar lá.

Resolvi, então, atravessar toda Plana e chegar até Calco. Não foi fácil, tive que me unir a um grupo de aventureiros que seguiam na mesma direção. Eles estavam à procura de uma espada mágica. O mago desse grupo me disse o poder do meu machado Bonarff (lâmina-larga, em escrita dos anões), afirmando ser possível concentrar nele ainda mais poder! Como eu segui para Calco, ele me disse para procurar o Colégio Livre de Basf, que eles estariam dispostos a me auxiliar.

Ele estava certo. Assim que cheguei, fui recebido por dois elfos dourados (confesso que, apesar de viver toda a minha juventude entre eles, jamais vi sequer um destes). Prontamente me levaram a conhecer o Colégio. São homens e até mesmo mulheres (em sua maioria elfas) que se reuniram com o propósito de ensinar magia e desenvolver novas técnicas místicas. Por ser um Colégio Livre, quase todas as raças estavam representadas, exceto os anões por sua inaptidão (apenas Blator sabe o porquê disso) e os pequeninos que também não são capazes de usar a magia (e eu, particularmente, acho melhor assim).

Busquei o poder dos elementalistas, como vi no último grupo de aventureiros no qual pertenci. Procurei conhecer os ventos e a terra. Sabia que o fogo era importante, mas a Luz mais do que supria sua falta para mim. Por haver poucos mestres nos mistérios das águas, nunca me interessei por essa arte, mesmo tendo provado de seus poderosos dardos congelados, em treinos ao ar livre no vale secreto em que se encontrava o Colégio Livre de Basf.

Conheci o terror dos necromantes, revivi o poder das ilusões e li sobre os deuses do panteão. Percebi que adorava os maiores deles: Palier, dos elfos, magia e conhecimento e também Blator, que aprendi a respeitar durante a minha estadia entre os anões. Li sobre os itens mágicos, principalmente com Meduseld, um elfo que se tornou meu maior amigo desde o meu nascimento. Acho que por ele ter sido rejeitado (nasceu cego de um olho), ele veio a se tornar um elfo mais rude que todos os outros que já conheci. Mesmo assim ele era honrado e de bom coração. Meduseld era ourives em Basf e instrutor para reconhecimento de itens.

Estava há pelo menos sete anos entre aqueles valorosos magos, quando, por mais uma vez, disse a Meduseld que queria partir, que sentia meus pés como adormecidos por viver tanto tempo no mesmo lugar. Faltavam apenas três semanas para meu aniversário e ele insistiu para que eu ficasse, pois gostaria de experimentar uma nova técnica que havia desenvolvido com a ajuda de magos do fogo.

Foi então que recebi pela segunda vez o mesmo presente. Meu machado Bonarff havia sofrido uma transformação pelas mãos do meu amigo quando, num trabalho primoroso, recapeou sua lâmina com uma liga de prata com pedras esmeraldas. A afinidade das pedras preciosas com a retenção de mana é conhecida há milênios e foi o que percebi quando pude invocar poderes mágicos usando o Karma pertencente ao meu novo machado, chamado agora por Meduseld de Elessar, a Lâmina Élfica.

Deixei com ele, além da minha gratidão, os originais da minha magia mista criada através dos meus estudos com os elfos e minha técnica com machados — o encanto “Corte Luminoso”. O feitiço ainda não estava completamente desenvolvido, não obstante com o que estava escrito muito já poderia ser feito. E este foi o clima de nossa despedida.

***

Dessa vez, não pensava no destino. Meu destino era o mundo. Saí para conquistá-lo a ferro e magia. Quem sabe o que os deuses guardam para o futuro?

Verbetes que fazem referência

Crônicas de Tagmar-volume 1
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