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CAPÍTULO 11 .




Elira olhava para o homem que a surpreendera no corredor. Não tinha visto ele antes e sua presença acompanhava medo.

Quando este terminou de falar “Bom vê-la, princesa” e sorriu amarelamente, Elira escutou um grito, forte, alto, vindo do outro lado do jardim. O som percorreu todo o local, sendo rebatido pelas grossas paredes do castelo. Virou-se e viu que Servilis, o sacerdote, pulara, rapidamente, direção a ela.

Nesse pouco espaço de tempo, Elira mal teve chance de avaliar os acontecimentos. Como foi rápido. Deu-se inicio ao fim da historia de Elira.

A princesa Elira, o olho fixo em Servilis, assistiu mais uma morte.

Quando terminara de cumprimentar Elira, Elmer, O Assassino, desceu sua mão, já treinada, direção ao bolso escondido de sua calça. Sentiu o frio do cabo e retirou, os dedos fixos para que não soltasse.

Já retirara todo o punhal e enrijeceu o braço para o golpe certeiro, rumo o coração da princesa Elira. Porém, no momento em que faria, um grito surpreendeu Elmer, que, de tanta felicidade por ter encontrado Elira sozinha no corredor, não esperava por interrupções, girou o corpo pela direita e viu o forte brilho do sol batendo no manto branco do homem que saltava em sua direção. O braço desceu rápido, impulsionando o peso da lâmina a frente, seus dedos soltando o objeto para que esse fosse reto. Os olhos logo viram que acertara o alvo.

Servilis, que saltara para aproximar-se de Elira, não tivera chance de escapar da arma letal que fora arremessada. O punhal penetrou seu manto branco, cortando tecido e carne, projetando sua ponta umedecida de veneno a circulação sangüínea. O choque da arma fez Servilis parar, recuou um paço atrás e ficou em pé. Levou a mão ao peito, onde se encontrava a arma. Os olhos piscaram aturdidos, como se perguntasse o que estava acontecendo. Tremulações vibraram seus lábios e a saliva escoria para fora da boca. Sua perna foi à frente e o peso do corpo já não era suportado. Em pé, cambaleou, girou e tossiu. Fel escorreu-lhe, manchando de vermelho as flores próximas. Sua mente registrava tudo, ainda tentando chegar perto de Elira. Deu alguns passos em direção a ela e, no esforço que pôde, disse “Assa-... ssassino”. Foi um lamento dolorido sua palavra.

Elira, apoderada de um medo único, emitiu um grito forte ao ver Servilis banhado em sangue, que escorria de seu peito. A visão que tinha mostrou o homem, perto de se, retirar outra lâmina que brilhava na mão. Sua boca abriu-se, mas não falou. Seus pés não se moviam. Seu corpo em estado de choque.

— Sabe, princesa, ainda bem que ele me pagou adiantado pelo serviço. Elmer falou, enquanto segurava outra arma, esta reservada para outro membro da família real. Só restava mais uma guardada nas roupagens.

Como se para selar o destino traçado pelos deuses, ou por um deus, outra voz fez ouvir-se no corredor de batalha.

— Um grande “não” foi o que escutaram.

Essa voz, de tonalidade juvenil, fez com que Elmer parasse. Já era perturbador demais o que estava acontecendo. Acabara de matar quem não deveria, e prestes a cumprir o contrato, mais alguém aparecera.

— Ora, pro inferno para quem tentar me intervir. Vociferou Elmer.

Aguçando os olhos, divisou três pessoas atrás de Elira. Um deles era, com certeza, um dos guardas do castelo. Sua armadura indiscutível. O outro era um mendigo, se não pior. E o outro, mais alto, vestia roupas de babados e cetins, talvez um dos nobres do Castelo..

Elira jogou-se no jardim, seu corpo batendo nas floris macias, seu único refugio na cena que se passava. O sol iluminando e abençoando o dia que já era tarde. Tarde para a família real de Dantsem.

Assim que adentraram no corredor, andando alguns metros, Figvel, Elril e o guarda escutaram o grito de Elira. Trespassou-os como ondas no mar agitado. Logo, trataram de correr em direção a futura rainha de Dantsem. Há alguns metros, podiam ver a silhueta de Elira, vestida de azul e branco, recuando rente um homem que estava a sua frente.

Talvez fosse a adrenalina que sentia, ou o medo de perder a mãe que acabara de encontrar, mas Elril sacou da bainha do guarda a espada e atirou-se para frente, suas pernas alongando-se na corrida frenética que se submetera, tendo gritado uma negativa ao caos que poderia acontecer. Figvel, velho e debilitado pelos poucos dias de reclusão, não podia correr, tendo apoiado-se no guarda para que esse o ajudasse.

Enquanto corria, Elril pensou em Selimom, o Deus da Firmeza de Espírito, e pediu-lhe bênçãos nesse momento de provação. Pensava Elril: “Selimom, Deus meu, protegei esse filho que a vós suplica ajuda”. Continuou a correr.

Pela descrição que Servilis, agonizante no chão, dera a Elmer, este sabia que o jovem, correndo em sua direção, era á outra vitima. Sentiu a adrenalina percorrer suas veias. Fazia tempo que não lutara, e hoje estava sendo um dia bom.

Alinhando todo o corpo verticalmente, Elmer preparou-se para um golpe. Seu corpo enrijeceu-se e ele levantou, o máximo que pode, o braço direito, tendo na ponta dos dedos o punhal envenenado preparado para o jovem imprudente que corria em direção a morte certa.

Elira afastava-se do homem que segurava um punhal e aproximou-se do corpo de Servilis. Todo vestido de branco, Servilis soluçava espumas de sangue. Seu peito ainda estava cravado pelo punhal, tendo sangue escorrendo pela abertura na carne. O lindo manto branco, trabalhado e decorado, escondia sua beleza na poça de sangue que se formava. A cabeça tremia por falta de oxigênio, de um lado ao outro. Agonia para o servo do Deus da Paz, que agora o aguardava...

Elril viu a mão do homem descer veloz, seu corpo projetando-se à frente. A perna direita esticada, também, à frente, e a esquerda para trás. O homem diminuiu sua musculatura enquanto o brilho da lâmina vinha rodopiando em direção ao peito de Elril. Sem escudo, sem armadura, apenas a espada na mão, Elril abaixou-se, mergulhando, para esquivar do ataque. O punhal passou próximo e Elril ouviu quando o metal bateu no mármore do chão. Levantando-se rápido, Elril continuou correndo enquanto o homem voltava a posição inicial. Elril brandiu um grito louvado, esperando que Selimom o ajudasse: “A coragem é minha força”.

E foi brandindo esse grito de coragem que Elril enfrentou Elmer.

A espada de Elril desce pela direita, de cima a baixo. O peso da lâmina impulsionou um pouco o corpo do jovem, mas este conseguiu segurar-se. Elmer esquivou do golpe baixando o peito para frente, no mesmo instante em que seu punhal, envenenado, tentava acertar a perna de Elril.

Elril sentiu como se possuído por uma força mística, algo cujo poder o transformasse. Uma luz tirou-lhe a escuridão dos olhos e Elril jurava que podia ver os movimentos futuros de seu rival. Quando o inimigo baixou-se se defendendo do golpe da espada e tentando cravar o punhal na perna de Elril, este a retirou rapidamente, colocando-se de costas a parede do corredor.

Elmer levantou-se e avaliou a situação.

— Não deveria brincar com gente grande, rapazote. Falou esboçando um sorriso maldoso para o jovem sacerdote.

Figvel e o guarda assistiam, de longe, a batalha. O guarda, por medo talvez, não entrara na luta. Figvel, tendo as correntes retiradas todo o seu Karma, não podia usar de magias. Servilis, o sacerdote, morria lentamente nos braços de Elira. Elira chorando e vendo uma esperança no rapaz que lutava com o assassino.

— A justiça de divina recairá sob você. Pagaras! Elril estocou a frente, sua mão cansando-se com o peso da espada. Elmer girou novamente, empurrando a lâmina com o braço direito. Atirou o punhal ao alto e aproximou-se do corpo de Elril. A mão esquerda, treinada para o movimento, segurou o punhal a tempo, e já estava na direção de Elril.

Elril viu a lâmina rumo ao seu pescoço. Tentou uma joelhada no homem, mas este mantinha as pernas firmes, impossível de ser acertadas. O que fez foi puxar a espada com toda a força, deixando Elmer sem equilíbrio. Deu certo, pois a mão com o punhal passou acima e fez Elmer recua, mantendo-se em pé sob o chão gramado.

Elril estocou novamente, Elmer esquivando. Estocava e estocava, atribuindo toda sua força para cortar a carne do inimigo. Elmer esquivava. Um jogo lento que Elmer queria, pois dessa forma, cansaria oponente e seria mais fácil abatê-lo.

As flores que perfumavam o ar do pequeno jardim estavam esmagadas ao chão. Grandes pegadas, formando um passarel, retirara o brilho dos botões-de-fada.

Elril continuou a estocar. Nunca fora bom de batalha e hoje seria sua provação. Cansou o braço. Parara de atacar. Recuou um pouco, para que previsse os golpes do inimigo.

Ambos arfavam de cansaço. O calor crescia. Alguém teria que ceder.

Elmer não podia mais esperar. Talvez, em breve, esse local estaria cheio de guardas. Não queria matar muitas pessoas hoje.

Retirando com a mão direita, outro punhal, Elmer segurou firmes as duas armas. Riscou o ar com ambas, ziguezagueando com movimentos de pulsos e antebraços. O brilho das lâminas favorecia o já treinado mestre de matar, que era uma desvantagem para o jovem Elril.

Elril não soube bem como fizera, mas no instante em que piscara o olho, o oponente arremessara um dos punhais contra ele. Atirando-se rapidamente próximo a fonte, Elril escapou da morte que vinha rasgando o ar. Não teve tempo de pensar, pois o assassino saltara em sua direção. Colocou a espada à frente, a ponta servindo de escudo. Preso as duas mãos, o cabo manteve-se reto enquanto defendia o primeiro ataque do assassino.

Estavam próximos um do outro. A distancia de uma espada e meio braço. Elril viu que o homem girava o punhal apenas com o pulso, deixando todo um lado esquerdo desprotegido. Elril colou mais força na espada, projetou a frente e impulsionou para que comesse a carne do homem.

No momento em que fizera, Elril viu que seu plano dera certo. O homem parara com um movimento de sua mão, deixando o punhal cair. Ainda de pé, expeliu uma grande quantidade de saliva. Sua face contorceu-se em dor. A boca abriu-se, os olhos arregalaram-se e sua mão direita elevou-se por trás, como se para pegar algo. A espada de Elril penetrando no peito do homem, mas cuja força não permitia passar pela proteção de couro seco que o assassino tinha.

Elril mirou os olhos atrás do assassino e viu Elira, a doce princesa Elira com a face dura, tomada por uma ira florida. Puxando a espada, Elril viu o assassino cair de joelhos, sua expressão perdida no véu de Cruine.

Elmer tombou ao chão, sua face beijando a terra esmagada pelas próprias pegadas. Um punhal estava cravado centímetros abaixo de seu pescoço.

Elira decidira a batalha.



***



Amanda passou pelo ultimo corredor do castelo com uma jarra de vinho do porto. Segurava uma bandeja de prata e três taças cristalinas, todas esverdeadas, junto à garrafa. Seus pensamentos voltados ao homem que amara sucumbindo a uma doença lastimosa.

A porta dupla mostrou-se à frente e Amanda ajeitou-se para abrir. Cuidadosamente segurou a bandeja com a mão esquerda e com a direita empurrou a madeira de lei. A porta abriu-se. Os dois primeiros passos mostraram o horror que caíra no quarto do rei. A bandeja foi ao chão, a garrafa quebrando-se, espalhando o doce vinho pelas lajotas azuis. As taças, cristalinas, criaram um chão azul, manchado de vermelho e salpicado de pequenos cristais esverdeados. Levou a mão à boca, vendo a cena que a espantara.

A cadeira com rodas estava vazia, uma pele de urso-cinza sob seu acento. No chão, uma poça de catarro e sangue ensopava o velho nobre que viera cumprimentar seu rei. O corpo de Lorde Avriom de Calinior estava contorcido no chão, suas pernas juntas aos braços e ao queixo. Ainda era visível o catarro sangrento escorrendo pela boca e nariz. Sua mão, esquerda, segurava o lençol da cama do rei.

Amanda foi à direção da cama de seu rei, na esperança de que nada tivesse acontecido com ele. Quando chegou, paralisou-a de tal forma que nem uma palavra disse.

O rei Jorge I estava quase desnudo, o lençol tendo sido puxado por Lorde Calinior. Da cintura para cima podia ver o consumismo da doença que o afetara. Os olhos estavam abertos, fitando o infinito alaranjado da abobada acima. Como se preso por pequenos ganchos, seus lábios estavam abertos, os poucos dentes escondendo a lúgubre boca. Sua carne sumira, deixando apenas pele e ossos. Não respirava.

Os mortos vestiam Azul.

Na manhã da segunda semana de primavera, o reino de Dantsem perdeu seu rei.

Lorde Avriom de Calinior seguiu escoltando a majestade para o julgamento divino.

CAPÍTULO 12
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